A propósito da postagem de ontem "PERIGOSO AGITADOR ARGENTINO PRESO NO RECIFE", recebo do amigo Arael Costa o texto abaixo sobre episódio acontecido nos esconsos dos Anos de Chumbo que apenas se iniciavam. HC
Arael Costa
Nessa linha de encontros e desencontros da época, veio-me à lembrança episódio parecido que envolveu o nosso Wills Leal, recolhido aos órgãos de segurança sob acusação assemelhada. O ocorrido foi o seguinte:
Éramos acadêmicos de Jornalismo e integrávamos a representação sindical da classe junto à Federação Nacional, o que nos fez ir a uma reunião no Rio de Janeiro, poucos dias após o incidente do Aeroporto do Recife.
Quando estávamos lá pelo Rio, divulgou-se, por cá, um retrato falado do autor do atentado, que coincidente tinha todos os traços de nosso amigo, que, sendo uma pessoa de muita movimentação na cidade - como bem sabemos, logo foi reconhecido como sendo o retratado. Do reconhecimento à busca, foi um pequeno passo.
Logo, Dona Neném - sua mãe, recebeu uma visita de uma patrulha que buscava seu filho agitador, tendo a pobre e ingênua senhora informado que seu filho fora ao Rio de Janeiro, viajando - claro, pelas asas do "Constellation da Panair" que ainda fazia uma linha Rio/J. Pessoa/Rio, onde se encontrava, sem nada saber desses fatos.
Regressei a J. Pessoa tão logo acabou o encontro e Wills resolveu ir a São Paulo visitar amigos da área de cinema, com quem passaria o final de semana para assistir, se não me engano, o lançamento de um filme de Walter Lima Jr. Só na madrugada da 2ª feira Wills retornou à cidade e assim que chegou em casa sua mãe lhe informou da visita.
Que fez Wills? Tomou o bonde e foi até o quartel do 15º RI, em Cruz das Armas, onde - imagina o alvoroço que provocou ao indagar do comandante da guarda, em cuja sala, decerto, estavam colados diversos cartazes com sua figura, o que queriam com ele. Lógico que foi imediatamente recolhido...
Já na 3ª feira, tomei conhecimento desse recolhimento e aproveitando as minhas relações de amizade com muitos dos oficiais do Exército, inclusive o comandante da área e os encontrando em uma solenidade, no final da tarde, os interpelei sobre o assunto e procurei uma "deixa" para lhes pedir a soltura do amigo, incapaz de matar uma mosca e incompetente até para soltar um "traque de chumbo". A oportunidade logo surgiu, navegando pelos copos de uísque que nos foram oferecidos, pelo que fiz então o pedido, enfatizando a minha convicção de inutilidade revolucionária de Wills, tendo meus argumentos rebatidos por um dos oficiais da "roda", que foi replicando para o comandante com quem eu falava, dizendo que Wills era um grande agitador.
Foi minha oportunidade de ouro. Retruquei, dizendo:
- "Realmente, Coronel. Wills é um grande agitador, mas de pedras de gelo em copos de uísque, com aquele dedo magro e comprido..."
As risadas do velho e experimentado comandante e outros oficiais que o acompanhavam seguiu-se o comentário:
- "homem, vá buscar o seu amigo, logo que quiser!"

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