HUGO CALDAS
Corria o ano de 1958. Cid Sampaio disputou e venceu as eleições para o governo do Estado de Pernambuco com o apoio de Luis Carlos Prestes e Gregorio Bezerra, dois ícones incontestes do PCB. Em um comício na Av. Dantas Barreto os tres apareceram juntos e a comunistada ensaiou uma sonora vaia quando Cid começou a falar. "Feliz é o povo que ainda pode vaiar os seus homens públicos," disse ele e a vaia morre no nascedouro.
No governo, Cid criou uma empresa mista estadual que se propunha a fabricar 27,5 mil ton/ano de um produto novíssimo. A Borracha Sintética. Para isso, além dos conchavos de sempre, Cid criou o Bônus BS, Bônus da Sorte, um adicional de 0,5% ao Imposto de Vendas e Consignações a fim de criar a Coperbo - Companhia Pernambucana de Borracha Sintética. Cada consumidor trocava o valor do Bônus BS, constante na Nota Fiscal, de qualquer compra ou transação comercial efetuada, por ações da Coperbo. Diziam, em tom de piada que as "Meninas da Rua do Rangel," não podendo dar o devido e competente BS, sofreram uma queda considerável na "arrecadação."
Mas de onde viria essa tão famosa fábrica? Se não me falha a memória, terminamos como sempre, comprando uma sucata. Dessa vez acho que do Canadá que também conseguiu emplacar uma empresa de engenharia mecânica para entrar na montagem da planta.
A empresa na realidade repassou a tarefa para a sua subsidiária brasileira e apenas se limitou a fiscalizar o bom andamento dos trabalhos.
Fui contratado como intérprete da parte brasileira, ligado à diretoria, formada por engenheiros de São Paulo. Era o elo de ligação entre as duas empresas. Vivia como aquelas "sombras" que de vez em quando aparecem em programas da TV. Colado ao engenheiro chefe dr. Pedroso, participando de reuniões de serviço com a chefia canadense, um trabalho insano. Estava tão afiado na tradução simultânea, que já podia me ver algum dia, trabalhando como intérprete da ONU.
Eis que certa segunda-feira, ah, as segundas-feiras, alguns dizem que definitivamente elas não deveriam existir - se nem a de carnaval é de boa serventia - o operador de um dos guindastes não compareceu ao trabalho, mercê quem sabe, de uma ressaca braba.
O guindaste em questão diziam, era o maior em atividade na América Latina e apenas um operador devidamente habilitado poderia manejá-lo. Mas sabe como é o brasileiro e seu famoso jeitinho. O dr. Pedroso resolveu tudo de imediato. Mandou um outro operador absolutamente sem qualificação para aquele tipo de trabalho dar continuidade aos serviços. Não poderíamos nos dar ao luxo de um dia parados.
Resumo da ópera:
No primeiríssimo lance para apanhar um enorme tubo de aço e levá-lo para um outro local a agulha do guindaste entortou partindo-se logo em seguida. Foi uma comoção. E agora? Como sanar uma situação dessas? Todo mundo com o coração nas mãos. O que vai acontecer?
Cerca de dez ou quinze minutos depois do incidente constrangedor, a direção canadense irrompe sala a dentro, o gringo chefe, Dr. Parson à frente, botando fogo pelas ventas, pergunta:
- Quem é o intérprete aqui? Respondo,
- Sou eu, Dr. Parson.
- Onde está o seu chefe?
- O Dr. Pedroso está aqui ao meu lado, senhor.
- "Tell this son of a bitch he is fired"! Embaraçado, olhei para o Dr. Pedroso e disse,
- Dr. Pedroso, portador não merece pancada, me desculpe, mas o sr. está demitido. Evidentemente o "son of a bitch" não foi traduzido a fim de evitar maiores contratempos.
Hoje, passados tantos anos pode parecer piada, mas na hora do acontecido o ambiente ficara irrespirável e a bomba não explodiu por puro milagre. O tempo passou e a fábrica continua em pé lá no canto dela e todas as vezes que a revejo a evocação desse acontecimento me vem à mente, bem como a cara aparvalhada do Dr. Pedroso, olhos esbugalhados, boquiaberto fitando o infinito, sem se dar conta talvez do que acabara de acontecer. Bons tempos em que a gente podia demitir os nossos chefes.... Bons tempos?
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