Saí
ontem do Cemitério São João Batista no Rio de Janeiro ciente de que a
vida estará sempre em risco e por um fio, enquanto não mudarmos nosso
comportamento em adequação a outras maneiras de conviver em grupo.
Seremos sempre vítimas inconscientes da nossa própria formação e
desinformação. E nada mais trágico de que o homem certo para decifrar
enigmas e profundezas da natureza humana, com o simples uso do diálogo,
tenha perdido a vida sem encontrar a solução.
Com
certeza, diante do ocorrido e se ele estivesse vivo, faria
provavelmente um filme com as perguntas imponderáveis aos jovens
adolescentes, tais como: “ O que leva um menino de 10 anos a atirar na
professora pelas costas e em seguida se suicidar?” Fato ocorrido numa sexta feira do ano de 2010 em São Paulo.
“O que leva um menino de 13 anos a matar a família e se matar em São
Paulo em agosto de 2013”. “ E porque um menino de 13 anos mata o irmão
de 12 com um disparo aparentemente acidental ?”
No
domingo, dia 2 de fevereiro, Eduardo Coutinho, um dos mais importantes
cineastas do Brasil foi assassinado pelo próprio filho. Diante dessa
tragédia surpreendente devemos perguntar: em que mundo vivemos? Será que
a violência não está mais entranhada em nossa cultura do que pensamos?
Está disseminada na sociedade de forma explícita nos conflitos armados,
mas também aparece diluída de forma oculta em meio ao comportamento
social e formatada pelos veículos de comunicação de massa. Nesse caso,
será que o cinema não tem alguma coisa a ver com isso? Tenho certeza
que este tema não iria passar despercebido e Coutinho iria rodear
calmamente em volta desse núcleo de incertezas para buscar a fonte
original do problema. E ele era o cineasta para isso.
Nas
primeiras décadas do século vinte, o revolver era o instrumento que
impunha a lei, balizava os conflitos e cumpria a função de eliminar, em
duelo justo, sujeito a regras rígidas, o personagem que feriu a lei,
matou a traição ou tentou impor sua vontade à população. Mas na
evolução dos tempos, as armas no cinema se tornaram mais sofisticadas e
letais. Incorporadas ao cenário urbano as armas de fogo adquiriram
status de efeito estético e performático indispensável para o filme de
ação. O cinema acompanha os movimentos sociais pois será sempre reflexo
do real ou do imaginário popular. No entanto estamos
recebendo, diariamente, através das salas de cinema e das TVs de
Assinatura, uma carga exagerada de séries de filmes de ação, nos quais
os conflitos são narrados de forma excessivamente violenta. E o
que vemos hoje é o recrudescimento nas telas, da violência desmotivada
e da crueldade envolvida com sadismo. Um cinema globalizado que
apresenta um mundo fictício mas convincente, para sociedades ingênuas
ou corrompidas e dominadas por criminosos e justiceiros. E no centro
dessa nova dramaturgia, poderá estar o revolver na mão de uma criança.
A
morte de Eduardo Coutinho é uma perda irreparável para a cultura
brasileira que vai se refletir na obra que deixou e inspirar os jovens
cineastas brasileiros a buscar, através do seu método, o fundo de uma
verdade inesquecível.
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