Ipojuca Pontes
Outro dia Lula da Silva apareceu para dizer o seguinte (reportando-se indiretamente ao mensalão): “Quem errou tem que ser punido!” Claro, Lula não se referia ao seu caso, embora tenha sido apontado como o principal beneficiário do “Escândalo do Século” na denúncia tornada pública pelo ex-vassalo Marcos Valério, o operador do mensalão, no processo encaminhado pelo Procurador-Geral da República, Roberto Rangel, ao Ministério Público de Minas Gerais. Nem tão pouco, é óbvio, ao companheiro José Dirceu de Oliveira e Silva, vulgo Pedro Caroço, o todo-poderoso Chefe da Casa Civil no primeiro mandato do presidente sindicalista. Pois, bem examinado os meandros da história, Lula, ao contrário do que se escreveu, não chegou ao Planalto pelas mãos apóstatas dos Boffs e Bettos da vida, nem muito menos pelo bafo retórico dos intelectuais da USP – entre eles Francisco Oliveira e Sérgio Buarque de Holanda, pai do Chico. Para eles, Lula não passava de um operário maleável, tornado ventríloquo para bradar, em escala primária, o velho trololó marxista.
Na verdade, o responsável pela assunção de Lula ao Trono do Planalto foi o obsessivo Zé Dirceu, mistura de aventureiro estudantil dos anos 1960 e, a posteriori, ativista político com aprendizado full time na Direción General de Inteligência (DGI) cubana, braço da KGB na Ilha de Fidel.
Para levar o sindicalista ao poder, Dirceu foi capaz de tudo. Neste compasso, depois das sucessivas derrotas de Lula, ele percebeu que o buraco era mais embaixo. Então, com uma plataforma pragmática, pôs em marcha a agenda de tarefas clandestinas, quando nocauteou com mão de ferro Collor de Mello, expurgou do PT a militância recalcitrante, tratou de encher os cofres do partido com dinheiro das prefeituras, associou-se às FARCs e, para cooptar a burguesia nacional, arrebanhou o empresariado sedento da grana fácil do BNDES.
Recentemente uma petista desgarrada afirmou que Dirceu era uma figura diabólica, “belo e mau como Satã”. Quem conhece a natureza sedutora do Mal, descrita por Santo Agostinho na “Cidade de Deus”, na certa concordará com a dissidente. Uma prova cabal desse veredicto pode ser deduzida da passagem de Dirceu por Cruzeiro do Oeste, a cidadezinha do interior do Paraná.
Chegado ao burgo no início dos anos 1970, após uma operação plástica em Cuba, Dirceu assumiu, na clandestinidade, o papel do comerciante Carlos Henrique Gouveia de Melo, tipo bigodudo e de nariz adunco interessado em negócios de confinamento de gado. De imediato, enquanto recebia informações de um “companheiro” estabelecido na área, Dirceu, muito persuasivo, conquistou Clara Becker, dona de uma loja de roupas femininas, logo recebendo da população o apelido de “Pedro Caroço”, personagem de “Severina Xique-xique”, xote de Genival Lacerda, o Rei do Rojão.
A primeira estrofe do arremedo situa o imbróglio: - “Quem não conhece Severina Xique-xique/ que montou uma butique para vida melhorar/ Pedro Caroço, filho de Zefa Gamela/ passa o dia na esquina fazendo aceno para ela” - enquanto o coro, ao fundo, entoa o refrão: “Ele tá de olha é na butique dela/Ele tá de olho é na butique dela!”
A segunda estrofe é mais elucidativa: “A Severina não dá confiança a Pedro/eu acho que’la tem medo de perder o que arranjou/ Pedro Caroço é insistente, não desiste/ na vontade ele persiste/finge que se apaixonou!”
Exatamente: estabelecido o paralelo elementar entre Severina e a ação dos aventureiros que tomaram conta da nação por força da persistência, logo se encontrará na rude paródia uma evocação acabada da sina brasileira, de resto, também ilustrada no jogo assumido por Zé Dirceu em Cruzeiro do Oeste. Na paródia, a butique de Severina, com seus bens e possibilidades, pode configurar o Brasil. E a conduta de Pedro Caroço encontra perfeito similar na ação da quadrilha organizada que passou, segundo o nosso Procurador Geral, a saquear o país em benefício próprio, fingindo-se “apaixonada” pela causa da redenção nacional. Por sua vez, a cantiga ganha sentido quando se percebe que, no refrão, a palavra “butique” evoca a expressão “butico” - sinônimo de ânus, orifício cujo desfrute a voz do povo diz ser o princípio ativo que move a vontade de certa elite política.
Não é em vão que Tóffoli e Lewandovsky, ministros do STF, propõem a troca da pena de prisão do milionário Dirceu por simples multa em dinheiro, ao tempo em que Mãe Conceição, umbandista de Niterói, prevê sua chegada, em 2018, à presidência da República.
Saravá!
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