
Recebi do amigo W.J. Solha alguns comentários sobre o seu livro "Marco do Mundo", recém-lançado. HC
Do Vladimir Carvalho sobre meu livro “Marco do Mundo”:
Solha, Salve,
Chegou aqui seu artefato.
E era só uma primeira folheada, meio acariciando o pequeno volume, curtindo a "metropolitana" capa, mas quando dei fé de mim foi subindo ( ou descendo? ) a sua Babel de estrondos abissais, e não mais pude abandoná-lo, a não ser ao termino de sua última linha. Não é um poema, é um torvelinho arrebatador.
Irei à forra relendo-o nessa Semana Santa. Sempre volto ao seu Trigal com Corvos e agora já me ponho a espera do Ecce Homo. Nunca estou pronto mas gosto do espanto que experimento lendo o amigo. Seu de sempre admirador, Vladimir Carvalho.
Meia hora antes, li este e-mail do Astier Basílio:
é meia noite e cinquenta e sete minutos qdo eu te escrevo.
Cometi
a imprudência de começar
a ler o seu "marco do mundo",
que peguei hoje no correio,
na hora de dormir.
Quem disse que deu para cancelar a leitura
depois de começada?
E quem disse que foi possível dormir depois de,
num jorro só, como que respirando junto
com o poema?
Li-o com um lápis comum. Grifando, conversando,
comemorando.
É um belo poema o que você nos dá.
E, como o personagem-poeta-você-mesmo,
sento-me diante do que li
e contemplo, com felicidade,
a travessia feita.
Osvaldo Travassos também me escreve:
Magnífico! Li de uma golada só, com pequenas interrupções de meu filho menor, da esposa e de ligeiras divagações.
Ah, as divagações...
Em certo trecho, lembrei-me de Pedro Santos e Fernando Teixeira no afã de construirem suas casas, que não usufruiram.
Um morreu e o outro separou-se da mulher.
Você, não!
Construiu essa casa-poema com a argamassa de sonhos, pesadelos e frustrações, povoando-a com seus anjos e fantasmas.
Belos.
Lendo, mergulhei nesta casa, neste poema, neste 'Marco do mundo", me sentindo, primeiro, olhando para um abismo que, aos poucos,
foi se preenchendo em uma imensa edificação, que panteisticamente falando, era você!
A cada imagem bonita que via, páginas e páginas marcadas. Não vou relatar todos os versos e (in)versos que marquei.
Apenas o primeiro: "... o poeta tem à custa de disciplina, a mente tomada de dados, vindos de todos os lados..."
E o último; "...Daí que existe Deus, diz o Poeta. E completa: Não como Cronos no trono, mas como o Tempo sem ...templo."
Você não tem jeito!
Jerdivan Nóbrega escreveu um artigo a respeito:
‘MARCO DO MUNDO’ de WJ Solha
Jerdivan Nóbrega de Araújo
Em sua mais recente obra literária, intitulada o MARCO DO MUNDO (Ideia, 2012, 100 páginas), e a segunda em menos de 12 meses, pois em 2011 o autor publicou o romance Arkáditch (Ideia, 221 páginas), WJ Solha volta a buscar inspiração na fonte dos grandes mestres da literatura de Cordel. Digo volta por que de outra feita foi em Leandro Gomes de Barros, o príncipe do Cordel, que o autor se inspirou para compor “A Batalha de Oliveiros contra o Gigante Ferrabrás”.
O MARCO DO MUNDO traz de volta à literatura nordestina uma modalidade poética há muito esquecida, pouco conhecida e, menos ainda, estudada. A última abordagem feita a respeito de “MARCO’ data de 1981, quando Professor Pontes editou o Livro “Romanceiro popular nordestino” dos estudiosos José Alves Sobrinho e Átila Augusto F. de Almeida”. Em 2011, a aluna da UFPB Luciany Aparecida Alves Santos volta ao tema com o artigo “O Marco: Uma Metodologia de Análise Marco”.
Segundo o artigo supracitado, o “marco representa para o poeta uma “fortificação”, “algo inabalável e imbatível, símbolo de sua superioridade de versejar sobre todos os seus pares”.
A titulação de “marco” a esta modalidade de cordel foi dada pelos próprios poetas ao porem a palavra no titulo da poesia, exemplo: O marco brasileiro e Como derribei o marco do meio do mundo, de Leandro Gomes de Barros; Um marco feito a Maxado Nordestino, de Franklin Maxado; O marco do meio do mundo, de João Martins de Athayde; O marco paraybano e Destruição o marco do meio do mundo, de José Adão Filho; O marco do castelo da cidade Flor Mimosa, de Manoel Vieira do Paraíso; O marco pernambucano, de João Ferreira de Lima; O marco do forte pernambucano, de Severino Milanez da Silva; O marco do Seridó, de Manoel Tomaz de Assis e Grande marco de Campina Grande, de Manoel Monteiro, etc...
Quando Ataíde escreveu do “Marco do Meio do Mundo”, Leandro. G de Barros respondeu com “Como Derribei o Marco do Meio do Mundo”. Não necessariamente um “marco” precisa de um opositor para desconstruí-lo. Talvez tenha sido a briga pessoal e pública entre os dois, Leandro e Atayde, que deu esta conotação, apesar de que no cordel, como na cantoria improvisada, o desafio é que dá beleza à obra.
Este preâmbulo, que acabou tomando todo o texto, foi para dizer o que é um “marco” no contexto da obra de WJ Solha, uma vez que o “Marco do Seridó, do poeta Manoel Tomaz, datado de 1927, muito embora ele o tenha refeito em 1954, foi o último que se tem registro, antes do “Marco do Mundo”. Já se vão 87 anos.
Se WJ Solha despeja no leitor em o “Marco do Mundo” a sabedoria universal, numa mistura religiosa e mitológica com a vida real, adquirida ao longo da história da humanidade, os grandes mestres Cordelistas se utilizavam em seus “Marco” da graciosidade concreta dos seus feitos fictícios: castelos, fortificações construídas no meio do deserto e pedras de três léguas de grossura, fincadas no fundo mar. Quanto maior o feito, mais difícil era para o opositor desconstruí-lo.
Um exemplo da construção do “Marco do Meio do Mundo” de Ataíde, é quando ele verseja:
“As águas dessa lagoa”.
Quem lá foi pode contar
Pessoas que entram nella
Como quem vai se banhar
Seja ladino ou matuto
Toma banho a sahe enchuto
Não praciza se enchugar.”
“Tem de sobra as floras nativas
Toda espécies da rozeira
Naquellas bellas paizagens
Na oiticica a gamaleira
Mais gigantesca do mundo
Cobrindo os sollo fecundo
Com floras da trepadeira’’
Abaixo, a desconstrução do marco de Atayde em “Como Derribei o Marco do Meio do Mundo”, de Leandro Gomes de Barros.
“Diz Athayde que há
Mysterio nessa lagoa
Água della não molha
Assim não pode ser boa
Não molha porque é seca
A lama fede que enjoa.”
“Diz elle que lá tem flores
Só vejo espinho de cigano
Das frutas lá só achei
Um melão de são Caetano
Ruído por passarinho
E já estava seco a um anno.”
A eloqüência e a diversidade de conhecimentos e informações dos versos deW.J Solha prendem o leitor e o convencem da grandiosidade da obra, assim como faziam os grandes cordelistas ao erguerem suas fortificações, assumindo para si o desafio de superar grandes poetas como fez Leandro e Ataíde. Fica, portanto, o desafio de se fazer algo melhor, sabendo que no final, assim como foi no inicio do século XX, quando sugiram os “Marco”, quem vai sair ganhando é a cultura paraibana.
Como escreveu o poeta João Ferreira, na última estrofe de “O Marco Pernambucano”:
“Fico Aqui esperando
Pelos colegas de arte
Quem lucta pela sciencia
Tem um gênio baluarte!
E quem não tem competência
Não agrava a outra parte.”
Fim
Nenhum comentário:
Postar um comentário