W. J. Solha
Para alguns autores novos que me trouxeram originais de seus romances, a fim de que lhes desse opinião a respeito, terminei – depois de analisar as obras - dizendo-lhes que deveriam ter paciência e trabalhar mais, nelas.
- Você não escreve pior do que eu. – doutrinei, igualmente, a cada um deles, com absoluta sinceridade - Mas normalmente passo mais uns dois anos em cima de um romance no estágio em que o seu está.
Diferente é o caso de um maduro Tarcísio Pereira e de uma sempre excelente Marília Arnaud, que me empolgaram recentemente com seus ainda inéditos “O Autor da Novela” e “Suite de Silêncios”, sinal de que a Paraíba vai arrebentar em 2011, na área.
Bem. Uma das características do novato é a pressa de publicação, ânsia de aplauso. Fui assim também, claro. Daí que quando Jurandy Moura me disse – em 1973 ( caramba: há... 38 anos!) - que achara minha primeira tentativa de chegar ao primeiro romance “Israel Rêmora” “uma merda”, levei um susto e me senti insultado, pois estava certo – como todos os que já me trouxeram seus livros - de que produzira uma obra-prima. Ele, calmamente, acrescentou:
- Quando a gente acaba de fazer um livro, está tão envolvido nele, que não lhe vê os defeitos. Faça uma coisa: ponha a data de hoje aí na capa, vá escrever outro romance e, daqui a exatos seis meses, releia o trabalho.
Revoltado, fiz o que sugeriu: fui escrever “A Canga” e, um semestre depois, morri de vergonha ao ver as mancadas de que o “Israel Rêmora” estava cheio. Passei mais de um ano enxugando o livro, até que o entreguei ao Barreto Neto, que me disse:
- Há um concurso novo no pedaço, que – além do prêmio em dinheiro – dá a publicação do romance pela Récord. Inscreva o seu. Se não ganhar, não acredito mais em concursos neste país.
Ganhei o Prêmio Chinaglia 1974... e a consciência de que toda arte exige muito, muito trabalho... e paciência. Cheguei ao exagero, no meu poema longo “Trigal com Corvos”, de reelaborá-lo durante catorze anos, enquanto produzia outras coisas. Nada de extraordinário: se Beethoven reelaborara a Quinta Sinfonia durante quatro anos, por que não? Se Joyce levara sete pra terminar “Ulisses”, assim como sete levara Cézanne pra ultimar “As Grandes Banhistas”, por que não?
Já a espera para o ator, na produção de um filme, é outra coisa. Kléber Mendonça Filho – era quase meia noite e ainda se preparavam as luzes, o som, os enquadramentos da grande cena de “O Som ao Redor” -, aproximou-se do elenco,e - atenciosíssimo como sempre - disse a mim, ao Irandhir Santos e ao Sebastião Formiga, que aguardávamos, tensos, o grito de “Ação!”:
- O cinema é a arte da espera...
E o pior é que não se pode, enquanto se espera, ler nada ou fazer qualquer outra coisa, pois a permanência da concentração é indispensável para que se consiga viver plenamente o que se vai representar. Daí que nós três ficamos repetindo o diálogo, corrigindo-o, aprimorando-o, voltamos a nos manter em transe - como médiuns em centro espírita -, até que, adrenalina disparando para o alto, pressão arterial idem, ouvimos a voz rascante da assistente Clara Linhart: - Atenção, silêncio, vamos rodar!!!
Já depois que o filme termina, a espera é outra. Ou, no meu caso, “são outras”, pois estou aguardando que sejam editados os longas “O Som ao Redor” e “Era uma vez Verônica” – esse do Marcelo Gomes – além do curta “Antoninha”, do Laércio Ferreira, todos feitos um em seguida ao outro.
Há perguntas que me atormentam: como terei me saído em todos esses trabalhos?, como terão se saído os colegas?, como terão se saído os diretores dos filmes e os diretores de fotografia?, como estarão se saindo os editores, os autores das trilhas sonoras?, quando os filmes serão lançados?, como reagirão as platéias?, como nos sairemos, todos, nos festivais?
Caramba.
Se tive de me superar na paciência em “O Som ao Redor”, a calma teve de ir pra estratosfera em “Era uma vez Verônica”, pois meu personagem, além de ocupar espaço maior no filme, era extremamente mais complexo. Sofri, primeiro, pra quebrar em mim o personagem anterior, o do filme de Kleber - rico, autoritário, sarcástico, seguro de si. Passava a ser um aposentado mal das finanças, doente, amoroso até dizer basta, tímido. Ponto quase em comum: seu Francisco adora os netos, que não o toleram, enquanto seu José Maria é doido pela filha ( a grande Hermila Guedes) , que é doída por ele. O laboratório, feito numa sala de balé, no mezanino do Paço Alfândega (ao lado da Livraria Cultura, no Recife), foi dificílimo. Se meu personagem saiu satisfatório, em “Era uma vez Verônica”, deverei isso ao PACIENTÍSSIMO Pedro Freire, que veio do Rio pra preparar o elenco, devo isso à magistral direção do Marcelo Gomes – tão gentleman quanto Kleber – que ( penso eu) soube tirar de mim o melhor que eu poderia fazer, ou até mais que isso.
E lá vem “Antoninha”, curta do Laércio Ferreira. Como no hotel da Consegueiro Aguiar, no Recife, em que passei noites e noites em claro, tomando cerveja, ensaiando sozinho e fumando – nada do que costumo fazer no dia a dia - tentando chegar a meu personagem seu José Maria, de “Era uma vez Verônica”, passo noites e noites em claro no hotel que me cabe em Souza, tomando cerveja e fumando – incapaz de dormir – ensaiando sozinho o meu Coronel João Bezerra Wanderley. Sinto um alívio enorme quando vejo clarear o dia, tomo um banho frio, vejo, pela janela, chegar o carro que me levará ao set de filmagem.
Mas no que dará isso tudo?
“Espere.”
Um comentário:
Mas, no cinema, há um outro axioma: O resultado é sempre surpreendente! Chamamos : Os deuses do cinema intervieram!
Eles sempre fazem isso!
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