José Virgolino de Alencar
Homem-Máquina ou Máquina-Homem não é o dilema shakespeariano de ser ou não ser, mas, de certo modo, cabe a indagação sobre que tipo de estrutura a relação do homem com a máquina será baseada no futuro, se seremos homens-máquina ou máquinas-homem. Eis a questão.
A evolução e o domínio da tecnologia estão moldando um homem autômato, um ser dependente da máquina, chegando ao ponto de se confundir com o próprio mecanismo tecnológico criado por ele. Deixando de lado as ciências humanas, perdendo a espiritualidade e mais das vezes a fé, o homem cola-se à máquina, fazendo o que ela faz e já não mais racionaliza as suas atitudes vitais, primamente na busca do humanístico, da arte, da filosofia, da teologia, enfim, da ciência enquanto contemplação do belo e explicação metafísica do sentido da vida.
Da transformação do ser-biológico (o homem na sua forma natural) em ser-cyberlógico (o homem-máquina), passar-se-á facilmente para a máquina-homem (a máquina com funções “humanas”), ou seja, o cyber-ser.
Alguém já vaticionou que o futuro será dominado pelos detentores monopolistas da informação. E como a informação será propagada e controlada pela tecnologia da informática, o todo-poderoso da posteridade será o dono e manipulador da máquina. Daí teremos a máquina-homem, o robô inteligente, capaz de realizar toda e qualquer tarefa que o homem hoje executa, é possível, aliás, que até mais. Contudo, o pensar profundo, as idéias que brotam do âmago da alma e do espírito humano, o indagar e o criar transcendental, tudo isso a máquina-homem não realizará jamais.
Talvez seja inexorável que se passe do homem-máquina para a máquina-homem. Afinal, o todo-poderoso detentor da máquina, embora não substitua o Todo-Poderoso detentor da alma e do espírito humano, não leva em conta a ação do homem originada dos insondáveis recônditos da inteligência cerebral, de onde floresce a criatividade artística, humanística. Com o poder da máquina nas mãos e a concepção de mando, esse todo-poderoso eliminará o homem, restando as espécies de áulicos, até porque estes serão robotizados e escravizados.
O cyberimperialista manipulará os cordéis que submeterão a Terra e todo o Cosmo às suas vontades e desejos.
Toda essa divagação em torno da dualidade “homem-máquina” – “máquina-homem” vem a propósito da grande paixão das pessoas pela tecnologia, do cenário que se desenha à nossa frente, aos nossos olhos, quando estamos nos deparando com exemplos de espécimes que absorvem, prematuramente, o ideal do todo-poderoso tecnológico.
Vemos aos montes pessoas que nem sabem da existência de conhecimentos humanísticos e nem imaginam que o direito positivo, o conjunto de normas que regulam a sociedade, tem origem no conceito de justiça e este foi posto à lume, para ciência e uso da humanidade, por gênios, estudiosos profundos do comportamento e da mente humanos. Entretanto, essas pessoas, por terem o domínio da tecnologia, por conhecerem a máquina e sua indiscutível capacidade de solucionar com rapidez questões operacionais, querem, então, resolver e resumir os atos humanos a mero apertar de botões e teclas, de movimentar “mouses”, de armazenar e de buscar dados nos “HD’s” das máquinas, sem atentarem para os mandamentos legais que dão suporte à estrutura do direito positivo, que deve ser aplicado com conhecimento de causa e senso de justiça.
Desconhecendo os princípios elementares do direito e da justiça, metem, indiscriminadamente e descriteriosamente, os dedos nas teclas do computador e varrem do arcabouço jurídico o direito adquirido e a coisa julgada. Para tais operadores, a tecla de deletar dados está acima das normas legais e, nas suas mentes curtas, o que ele vê na tela não tem relação com direito, com basilares princípios de justiça.
Para quem tem um mínimo de sensibilidade para as ciências humanísticas, para o pensar e o saber transcendentais, dá náusea ver uma mamparra qualquer transformar sua digital e indigitada ferramenta em engenhoca de triturar o que de melhor existe no conhecimento humano, da ciência humana, da criativa mente humana, que o cérebro eletrônico, hoje ciência da tecnologia, não terá capacidade de superar.
Sócrates, Platão, Aristóteles, São Tomás de Aquino, Kant e tantos outros gênios podem, em suas funéreas decepções e impossibilitadas reações além-túmulos, retorcerem-se nas sepulturas, dando por perdido tanto estudo, tanta pesquisa, tanto trabalho para deixar gravadas no papel tantas idéias, fruto de sua genialidade.
Os bytes, megabytes, gigabytes, miríadebytes e o mais de números superlativos que se possa inventar, nada disso suplantará aquela bola de feição sinistra e misteriosa que é o cérebro do homem, de incomensurável capacidade e variadíssimas possibilidades de criação e invenção.
A máquina-homem ou o homem-máquina podem esterilizar e dominar momentaneamente o homem-ser-humano, mas não o destruirá.
Jamais o pensar será vencido.
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