sexta-feira, março 27, 2009

Clô, Para Os Íntimos


Hugo Caldas


Nunca o vi pessoalmente mas sempre através, como dizia Sergio Porto, da "Máquina De Fazer Doidos”. O admirava pela inteligência, pela cultura, pelo bom gosto, pela perspicácia e muito principalmente pela falta de papas na língua. Essa última digamos, qualidade, é que ocasionava sempre ser demitido dos vários canais de tv nos quais trabalhou. Personagem da mais fina ironia, respostas ferinas. Quem não soube das suas cruéis alfinetadas na deputada Cida Diogo? A nobre deputada colhia assinaturas para representar contra ele no Conselho de Ética, por quebra de decoro parlamentar. Aos prantos, ela foi se queixar ao deputado Inocêncio Oliveira que presidia a sessão, que o deputado Clodovil havia lhe dirigido palavras de baixo calão no plenário. Segundo Cida, ele havia dito que ela "era tão feia que não servia nem pra ser puta...". Clodovil a princípio negou a historiada toda para logo em seguida revelar o que teria dito à deputada:

- "Uma moça bonita poderia se ofender, mas poderia também se prostituir, o que não é absolutamente o seu caso. A senhora é uma mulher muito feia”.

Quem não recorda as suas antológicas rusgas com a Marta Suplicy? As brigas inventadas (feito Emilinha e Marlene) com o eterno "rival" Dener? Viveu intensamente, isso é o que importa. Vestia-se na maior elegância. Tudo o que jogava em cima de si era milimétricamente estudado. E lhe caía muito bem. Com o seu desaparecimento perde o país a oportunidade de presenciar na Câmara, altos e irônicos debates. O Congresso já foi palco, desde a Primeira República de acontecimentos no mínimo curiosos.

... Tempos atrás, ocupava a tribuna em esfuziante arenga o senador pelo Piauí, Vitorino Freire, quando foi abruptamente apartado por um nobre colega com a singela declaração:

- "Vossa Excelência é um mentiroso"

- "É a mãe"! Respondeu de bate-pronto o senador Vitorino Freire. Para em seguida serem os dois admoestados pelo presidente da mesa: "Moderem as palavras nobres senadores, tenham modos, por favor. Mais respeito no recinto do Senado". Vitorino logo se desculpou pelo insulto à progenitora do nobre colega mas acrescenta ameaçador:

- Desculpe, Senhor Presidente. Mas se ele me chamar novamente de mentiroso, "a velha volta ao plenário". De outra feita o deputado Carlos Lacerda se alongava em um entediante discurso sendo aparteado pela Deputada Ivete Vargas nos seguintes termos:

- "O seu discurso é muito chato e o senhor é um purgante", ao que Lacerda rebateu:

- "E a senhora é o efeito do purgante!”

Clodovil foi eleito deputado federal com expressiva votação. Como primeiríssima providência mandou reformar tanto o apartamento funcional como o seu gabinete na Câmara. É voz corrente que só no apartamento ele despendeu coisa de R$ 200.000,00. O detalhe é que ele mesmo pagou tudo do próprio bolso. Deve ter ficado um luxo! Tanto que vários parlamentares, tal qual hienas vorazes, estão disputando no tapa os dois imóveis.

As grandes almas sempre têm grandes e belas atitudes e nunca as revelam. É que eles não estão "investindo" na vida eterna numa boa. Frank Sinatra por exemplo, tinha verdadeira comoção com crianças cegas. Descobriu-se só após sua morte que ele financiava mais de dez hospitais especializados para crianças cegas ao redor do mundo. Ayrton Senna também deixou quase tudo pronto para uma Fundação de amparo às crianças pobres. A sua irmã também só tomou conhecimento após o acidente fatídico. Com Clodovil não foi diferente. Ele já havia registrado seu testamento destinando todo o seu patrimônio para a construção de um orfanato que deverá receber o nome de "Casa Clô". Quem especulava sobre a fortuna que deveria ir para os cofres do governo, quebrou a cara.

Vai, rapaz. O teu lugar está lá te esperando. Fico aqui na maior torcida. Vê se consegue se enturmar com um sujeito com pinta de hippie dos anos 70, por nome Francisco de Assis. Gente muito fina. Ah e vê também se dá uma força nas roupinhas dos homens lá em cima. Há mais de dois mil anos que eles vestem a mesmíssima túnica démodé. Dá uma mexida geral neles todos. Bota pra quebrar, mas é aconselhável ter papas na língua.

Já foi dito que os amigos não morrem, se encantam. Clodovil não morreu. Nem se encantou. As grandes estrelas jamais desaparecem.

Elas simplesmente saem de cena.

hucaldas@gmail.com
newbulletinboard.blogspot.com

5 comentários:

Celso Japiassu disse...

Bela crônica, grande homenagem ao deputado Clô.

Anônimo disse...

Huguíssimo
Amei a crônica-homenagem ao Clô. Deu ainda mais saudades da irreverência e coragem que ele sempre teve. Já está fazendo falta. Ósculos e amplexos
Aline

Anônimo disse...

Caro amigo Hugo
Excelente texto sobre o Clodovil. Mais uma vez gostaria de te sugerir que juntasses esses textos e os publicasse de alguma forma, em papel. Acho que já te fiz esta sugestão mas, talvez por modestia, não deste atenção. Posso não ser um bom escritor mas sou um leitor assíduo e, sem modestia alguma, reconheço os bons textos. Muito obrigado pelo prazer que me faz te ler. Geraldo

Mary Caldas disse...

Hugão
Gostei muito da sua homenagem a Clodovil nesta crônica. Reuniu os melhores momentos desta figura exuberante que tanto marcou o país pelo jeito peculiar de ser.
Saudades de Clô e Parabéns pra você.

Unknown disse...

Adorei a crônica feita para Clô, realmente... ele não tinha papas na lingua , isso era o que tornava uma pessoa especial.

Bom coração ele mostrou que tinha doando sua propriedade para construção do orfanato.

Bjs. Saudades :)