quinta-feira, dezembro 06, 2007

VARIAÇÕES SOBRE UM MESMO TEMA - OPUS 70


Hugo Caldas

Fim de semana, você decide ir à um restaurante, senta-se à mesa e pacientemente espera. O garçom faz vista grossa, e não lhe atende. O mesmo pode acontecer em outro lugar qualquer, uma loja por exemplo, você espera com a maior paciência deste mundo, calado, enquanto todos, absolutamente todos os vendedores, terminam suas conversinhas particulares ao celular. Você parece estar pedindo o maior favor do mundo, ansiando por um sorriso ou esperando apenas simplesmente ser notado e atendido.

Nos bancos então, você aguarda tranqüilamente que os caixas, são sete guichês mas apenas três funcionam, terminem a animada conversa e dissimuladamente abaixem a cabeça fingindo não lhe ver. Quando você é "pé na cova" então, o desastre é inquestionável, previsível.

Ou pode ser exatamente o oposto. Em loja de sapatos, por exemplo, enquanto você dá apenas uma olhadela furtiva na vitrine, logo o vendedor se aproxima, e ameaçador, pergunta à queima-roupa:

- É esporte ou social?

É de cortar o coração. Oito ou oitenta. Sou do tipo que reclama. Se estiver no meu direito e for desrespeitado, se alguém acha de furar a fila dos idosos, vem bronca no ar.

Os centavinhos do troco nas lojas de supermercados principalmente, são outra fonte de discórdia. Há um Bom-Preço em Piedade com 59 guichês. Tive um aluno, caixa do supracitado que me confessou receber ele e outros 58 felizardos cerca de R$ 25,00 a R$ 30,00 de abono mensal por conta dos centavos não entregues no troco. Formidável, não? Fazer filantropia com o chapéu alheio...

Mas devemos estar felizes da nossa vidinha à-toa pois o Brasil mudou de patamar e ingressou definitivamente nos grupos de alto IDH, aponta a ONU.

- Nunca antes, etc. e tal...

Saibam todos, por exemplo, que o bairro da Boa Viagem não é saneado. É fossa pra tudo que é lado, prejudicando o lençol freático. Bairro (eu disse BAIRRO) até pouco tempo considerado de "barão" tem quase 550 mil habitantes. Montpellier, cidade (eu disse CIDADE) no sul da França onde mora um dos meus filhos exibe um número bem mais modesto. Apenas 350 mil. E eles lá reclamam da qualidade de vida. "Ninguém pode mais andar nas ruas com tantos automóveis," dizem.

- E nós, como ficamos? Façamos um cálculo bem simplista:

Em frente à minha casa construíram um prédio de 22 andares. Dois apartamentos por andar. São 44 apartamentos, ou seja, 44 famílias que irão morar em um espaço que abrigava 3 terrenos. Melhor dizendo, onde moravam 3 famílias agora irão morar 44. A oferta de água não aumentou. A rua não ficou mais larga. O esgoto continua o mesmo.

Até quatro ou cinco anos atrás passavam pela minha rua apenas duas linhas de ônibus. Hoje são quarenta e oito. É o mesmo que morar ao lado do "Minhocão" de paulistana reminiscência. A poluição é exatamente a mesma. Ou talvez pior. Coisas do Dr. Jarbas et caterva.

- Mas há coisa bem mais aterradora:

"ATENÇÃO! RUA COM GRANDE RISCO DE ASSALTO! OCORRÊNCIA CONSTANTE." Estampava semana passada, faixa exposta na entrada de uma rua bem perto da minha casa.

"Nós somos abençoados por Deus," diz o outro!

Acho que vou terminar morando numa favela qualquer pois, afiança-nos o capadócio, não se constitui nenhum deslustre. Agora, pergunta se ele e a “italiana” querem se mudar para a Rocinha! Nunca antes neste país, etc. etc!

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