quarta-feira, maio 29, 2013

A Arte da Sra Ferkel

Carlos Cordeiro

A idade e uma insônia forçada fazem com que me levante de madrugada numa espécie de torpor vigilante, seja lá que diabos seja isso. Ocorrem em borbulhão ideias de contos, roteiros, artigos cheios de verve venenosa. Não sei, se eu tivesse um desktop, talvez isso tomasse forma. Hoje, por exemplo, veio-me a ideia de um conto,  "A arte da Sra. Ferkel". Passo o roteiro:  CC

A Sra. Ferkel é uma velhinha meio gorducha, casada com um velho relojoeiro de Bremen. O casal habita um pequeno e velho sobrado, no subúrbio. Todos os dias ele acorda, toma com pachorra seu desjejum de ovos estrelados, café e presunto, veste um casacão e desce para a oficina. Ao meio-dia em ponto, sobe para almoçar, come com ruídos de javali esfomeado, faz uma rápida sesta, emborca uma caneca de café e volta para a oficina, de onde sobe novamente às seis, para jantar, ler o jornal e dormir. Toda sexta-feira, separa uma hora para ir com a Sra. Ferkel a uma mercearia, onde compram os gêneros alimentícios necessários à semana. Na hora de pagar, ele retira alguma coisa que a mulher colocara furtivamente na cesta - uma pequena torta, uma barra de chocolate, um punhado de caramelos - paga e voltam pra casa. Uma noite, ela descobre que ele acorda irritado com o ronco dela, e tem uma ideia: treinar durante o dia, enquanto cuida da casa, aumentar o volume do ronco, e assim  impedir-lhe o sono. Cada dia ele vai aparentando mais cansaço, tem olheiras, boceja sempre. E acaba falecendo. Ela enterra o velho e tão logo volta do cemitério vende os trastes da oficina e as roupas do finado, compra umas roupas pra ela, emboneca-se e vai à mercearia, onde compra uma batelada de chocolates, tortas, presuntos, compotas, cremes, queijos e vinhos e, em casa, promove um grande banquete de delicatessen, empanturra-se e morre de indigestão.

2 comentários:

Celso Japiassu disse...

O amigo Carlinhos está em grande forma.

Hugão disse...

Jovem Carlos
Isto está bom demais. Acho melhor como conto, cinema já era. Esqueça.
H.