quinta-feira, abril 18, 2013

Estatísticas

Téta Barbosa

Victor tem 16 anos e mora no Recife. Ele sabia que poderia ser assaltado qualquer dia desses. Sabia também que deveria entregar o celular sem reagir. Sabia inclusive que, ao chegar em casa, eu diria: vão-se os anéis, ficam os dedos – frase muitas vezes repetida na família.

Victor tinha certeza de que morando em uma das cidades mais violentas do Brasil, mesmo que o Pacto pela Vida criado pelo governador diga o contrário, faria mais cedo ou mais tarde parte das estatísticas. As estatísticas do Estado e da família.

Eu tive três carros roubados, a ponto de ser gentilmente convidada a me retirar da seguradora. A minha irmã teve sua casa invadida e assaltada. O meu irmão sentiu a frieza de um revolver apontado em sua testa. Victor sabia disso e levava consigo a sina familiar de classe média que vive assustada e olhando para os lados.

O que Victor não sabia, no entanto, é que ser assaltado faz a perna da gente tremer. Ninguém avisou que o coração dispara como um cavalo de corrida.

Não sabia da humilhação, do sentimento de impotência, do medo que passará a acompanhá-lo toda vez que sair à rua. Victor nunca soube que fazer parte dos índices faz a gente suar frio enquanto lavas quente de pânico percorrem nossas veias. Ele não sabia da raiva.

Agora, infelizmente, sabe.

Imagina que os homens de bicicleta e armados são analfabetos e, por isso mesmo, coitados, não leram as últimas declarações que anunciam a queda vertiginosa da criminalidade no Recife. Os números apontam, as porcentagens não mentem, o Recife é uma cidade mais tranquila, dizem.

O menino, que deveria estar preocupado com namoradinhas e provas de química, agora discorda do discurso político de quem está mais interessado no próximo cargo público, presidência quem sabe, do que no bem estar de um adolescente.

No mesmo dia que Victor foi assaltado, um outro Victor, este de São Paulo, não teve a mesma sorte. Perdeu o celular e a vida. E assim caminha o país do futuro.

Vão-se os anéis, é certo. E com eles, vão-se também a inocência, a paz e um pedaço do amor que a gente tem pela cidade e pelo Brasil.

Não somos um número, seu moço. Não somos índices nem gráficos. Temos nome, sobrenome e sonhos. Pagamos impostos, atravessamos a rua na faixa de pedestres, comemos de boca fechada, damos bom dia ao porteiro, aguamos as plantas, olhamos para os dois lados antes de atravessar a rua.

Fazemos nossa parte. Quando os senhores vão começar a fazer a de vocês?

 Téta Barbosa é jornalista, publicitária, mora no Recife e vive antenada com tudo o que se passa ali e fora dali. Escreve sobre modismos, modernidades e curiosidades. http://www.batidasalvetodos.com.br/

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