sábado, fevereiro 16, 2013

Impregna ou impreguina?

Você vai ficando velho e de repente, não mais que de repente, que nem carro antigo, começa a apresentar mil defeitos. Dá-se conta de uma má respiração aqui, uma canseira ali e vai tentando levar a vida da melhor maneira possível. É meio difícil, mas eu não me entrego. Sou feito o Corisco de Glauber, "só me entrego na bala de Parabélum na mão."

Eis que precisei renovar a minha carteira de motorista e fui simplesmente reprovado no exame de vista. Dificuldade em ler umas letrinhas bem menores do que aquelas da sopinha que a mãe da gente fazia. Quis dar uma de espirituoso alegando que não iria encontrar carro ou caminhão do tamanho das letrinhas pichititinhas. Eu não estaria me habilitando a chauffer de autorama. Me dei mal, muito mal. A senhora doutora estava visivelmente de mau humor naquele dia. Desconheço a razão. Talvez, quem sabe o respectivo não comparecera na noite anterior...? E aí sobrou pro otário aqui descobrir, que em sendo portador de um problema de catarata teria que fazer uma cirurgia e voltar para um novo exame sabe Deus quando. Mas isso foi apenas a ponta do imenso iceberg que daí por diante iria me acompanhar.

Dirigir ou não dirigir o meu intimorato Jipe Gurgel, Xavante X-10, that is the question.

Há tempos sabia do problema e já há quase dois anos estava inscrito em um desses programas de governo do tipo SUS. A operação, por baixo, está custando uns sete mil. Literalmente os olhos da cara. Plano de saúde não tenho, aliás, tive mas desisti, rompi de vez com essa despesa cara e inútil, verdadeiro saco sem fundo. Um dos meus filhos era quem pagava, mas achei absurdo.

Após inúmeras idas e vindas, visando acelerar o processo, consegui uma consulta em outro órgão do governo, dessa vez no âmbito Municipal, Santa Casa de Misericórdia, e certo dia ao cabo de uma espera de quase quatro horas em meio a um cadinho que fumegava com gente de todos os tipos, castas e idades, recém saídas da sala de cirurgias ostentando orgulhosos, um enorme inchaço no olho (um só) coberto por esparadrapo. Gente a dar com o pé, uma verdadeira sucursal do inferno, fui finalmente examinado. Pela enésima vez. Ao final da consulta o diagnóstico desanimador. "O SUS não autoriza a sua cirurgia porque o sr. ainda tem noventa por cento da sua visão"! Pelo que, o idiota aqui pôde depreender, tem que se estar cegueta da silva para poder usufruir da "perfeição da medicina pública brasileira”.

Correndo os passinhos fui aterrissar em consultório de outro médico, com consulta paga, tudo de acordo com os conformes que, após a repetição dos costumeiros procedimentos, "é melhor esse ou esse," "assim ou assim," o esculápio me solicitou reiteradamente fazer um exame caríssimo, com o uso de "contraste" por causa de uma anormalidade apresentada no olho esquerdo e que ele não poderia definir no consultório. Novamente saio em via-crúcis na busca de um laboratório, o que foi conseguido com a ajuda da minha filha.

Nova consulta, mais dispêndio. Sou então encaminhado a um cubículo constrangedor de uns três metros quadrados compartilhado por sete pessoas, a seguir discriminadas: Dois médicos, a amiguinha de um deles, uma enfermeira pilotando o computador, outra que cismou de espancar a minha mão direita no intuito de conseguir uma veia para a aplicação do tal contraste usado no exame. Eu, e o meu neto. De súbito a completa escuridão para levar a efeito o acurado exame quando alguém, um dos médicos, no meio das conversas fora de propósito sobre o último fim de semana na praia, de forma absolutamente inesperada, perpetrou a essencial, definitiva e meritória indagação:

- "É impregna ou impreguina?"

O sangue me ferveu nas veias e tive ganas de desancar o ignorante. Fosse eu a Rainha de Copas do País das Maravilhas gritaria histérico:

- "Cortem-lhe a cabeça".

Achei melhor, entretanto, não reagir. Sei como são as coisas nesta terra de doutor, de seu doutor. Sei perfeitamente onde piso, sei onde vivo. Iria com certeza piorar as coisas. Melhor seria deixar para depois. Convenhamos, no entanto, que é uma tremenda falta de respeito. Recebi após quinze dias o resultado e sabe Deus o que me espera. Voltarei ao médico que me ordenou o tal exame esta semana, estou ansiadamente a espera do veredicto final. Cuido que os meus três leitores fiéis me desejem boa sorte. Quero voltar a dirigir. Pelo menos isso!

Maio de  2009

3 comentários:

VIRGOLINO disse...

Amigo Hugo: Quando minha carteira venceu em 2009, sofrendo problemas na coluna que me impediam de guiar, não renovei a carteira.

Nem me preocupei em saber como legalmente resolver a questão, se desejar nova habilitação.

Estou, assim, impregnado de dúvidas.

E fiquei impregnado de raiva ao ler "impreguinado".

Carlos Cordeiro disse...

Hugázio, eu tbm tô na mesma e num sei se vou tirar nova carteira. Pra
quê? Num tenho carro, não dirijo carro de outra pessoa e já fui
reprovado por uma médica machona no Detran, antes da operação. Essas
coisas impregnam e impreguinam qualquer um.

Unknown disse...

Não sei se o blog ainda está em uso mas mesmo assim vou comentar. Vim aqui com a intenção de sanar a dúvida que o médico teve kkk. Mas acabei lendo uma ótima crônica sobre algo que todo brasileiro já passou. Quero lhe dar os parabéns n]ao é fácil fazer esses meus olhos adolescentes lerem um texto assim sem nem saber do que se trata. Abraços. continue assim.