Aos 7.1 anos de vida (completados ontem, 1º de novembro), assumo a condição de membro da terceira idade, porém recuso-me a entrar no bloco dos “velhos”, aposentados, inativos, que mourejam reclusos dentro de casa, trajando um surrado pijama, com uma perna maior do que a outra, calçando sandálias de tiras entre os dedos, em tamanho maior do que os pés, arrastando-se, engomando o chão, sem destino, mesmo no limitado espaço de sua habitação. E ao zanzar pela casa, em busca do nada, depara-se com a mulher de vassoura na mão, ameaçando: “o que é velho hoje vai para o lixo”.
Esse cenário bate na minha cabeça como um alerta para não me tornar um ator da comédia encenada no teatro da velhice doméstica. Para fugir disso, mantenho-me em atividade, trabalhando, produzindo, tentando criar algo, ainda que a criação possa ser modesta, contanto que seja suficiente para evitar sucumbir no anonimato, esquecido até pela própria família.
Em que pese o meu esforço em segurar de pé o corpo vulnerabilizado pela idade, não há como escapar do peso dos anos, do desgaste do organismo, dos achaques, fruto da inexorável deficiência na força física, sentindo dor aqui, dor acolá, que de certo modo perturba o desempenho, principalmente em quem é irrequieto, não aceita ficar parado, deseja a todo custo estar em plena atividade, com a mente em movimentada ebulição.
Este é o meu caso. Contudo, tenho que conviver com o estigma do peso dos anos. Assim, há vários anos venho enfrentando problemas decorrentes do desgaste da coluna vertebral, cujos diagnósticos, da tomografia computadorizada e da ressonância magnética, mostraram a conjunção de vários males nas diversas partes da coluna, como escoliose, lordose, bicos de papagaio, calcificação e uma tendinite na região cervical, no lado direito, cujas dores parecem uma agulhada espetando o nervo, irradiando pelo ombro, pescoço e braço direito, quase que paralisando a metade direita do corpo.
Sob cuidados de vários profissionais competentes e bem preparados em tratamento da coluna, os resultados não são melhores porque o médico é cientista mas não é milagreiro. O meu problema ameaça extrapolar os limites da própria capacidade da medicina, que não pode reverter situações que estão consubstanciadas nos desígnios do Criador, arquiteto-mor do desenho do frágil corpo humano, inexoravelmente castigado pelo peso dos anos.
Após pouco dias de trégua das dores e de alívio no sofrimento, sempre ressurgem as dores na coluna cervical, dores fortes, agudas, capazes de jogar a gente no clima de baixo astral, de desânimo, de inapetência, de inércia enfim. Apesar disso, resisto em não ficar deitado na cama, onde as dores são amenizadas e toleradas, mas que oferecem apenas a monótona rotina de ficar assistindo vídeos, curtindo a duvidosa qualidade da mídia televisiva.
Aos trancos e barrancos procuro ficar de pé, fazendo o que posso e o que sei. Com o lado direito quase paralisado, a dificuldade de digitar no teclado do computador é grande, diminuindo sobremodo a produção, além de tornar dificultoso o contato com o mundo via internet, deixando a sensação de que estou fora do universo, das informações em tempo real, como das agradáveis discussões em torno de ideias, de pensamentos e de pontos de vista, em cujo contraditório a gente aprende e muito.
Essa exclusão é para mim incômoda e me assusta, se a consequência for o afastamento definitivo do mundo virtual, que me dá sangue e nutriente mental, alongando a existência, oferecendo-me melhor qualidade de vida para enfrentar as vicissitudes do pesado fardo que os anos vão assoreando sobre o corpo no transcorrer da caminhada rumo a outro plano, que todos os credos juram ser uma passagem “desta para melhor”.
Pode ser. Mas prefiro continuar, com dores e tudo, aqui neste lado da vida, apelando para que dona morte demore a bater em minha porta com seu inconvincente consolo de que me levará para a corte celestial, onde estará a verdadeira e sadia alegria, sem dor, sem choro, sem lamúrias.
Será assim? Por enquanto renuncio à oferta, sugerindo que vá bater em outra porta, ofereça tais benesses a quem se disponha a aceitá-las e esqueça da minha.
http://josevirgulinoalencar.
Um comentário:
sr. José Virgolino,
Bacana o texto! Importante pensar assim.Em qualquer tempo devemos ser úteis... Parabéns pelo aniversário e pelo texto! Saúde e paz.... Abraço. Márcia
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