man ray
Ensaio ilustrado de W. J. Solha
Nem sempre é do futuro que se saca um adiantamento com que se faça algo novo. O maior exército do mundo, no século XVII – o holandês – sofreu revés extraordinário quando levado, nos Guararapes, a uma armadilha que retomava Leônidas e seus 300 de Esparta contra o gigantesco poder de Xerxes, nas Termópilas. Os viets, por sua vez, derrotaram os ianques com a guerrilha oriunda de nosso velho sistema indígena de luta, chamado guerra brasílica, utilizado com o mesmo sucesso na Insurreição Pernambucana. O Renascimento Italiano, de igual modo, foi a retomada do que se alcançara em termos de Arte, na Grécia Clássica arrasada pelo Império Romano. O movimento art deco se deveu, em grande parte, à descoberta do deslumbrante tesouro de Tutankâmon, no início do século XX. Já o nosso José Rufino e grande parte da arte dita contemporânea, por sua vez, abeberaram-se em Duchamp, que fez sua revolução estética justamente no início do século passado.
Do mesmo modo, na nova mostra – Across Lens - fascinado pelo registro fotográfico experimental do movimento e pelo trabalho com branco, preto e cinzas, João Lobo retoma os passos de Man Ray, cuja técnica floresceu nos anos 1920.


- Por que Across Lens, João?
- Preferi um título que desse uma impressão não muito realista das imagens. Algo embaçado mesmo. Uma visão turva que imprimisse da realidade uma leitura meio subjetiva.
- Por que a opção pelo preto e branco mais os cinzas?
- O monocromatismo está mais afinado com a reflexão sobre a luz e o movimento.
- Por que Man Ray?
- Entendo a fotografia como algo além do retrato. Man Ray imprimiu uma série que chamava de raiografias, "rayographs", de que você acaba de mostrar dois exemplos, onde a fotografia realista, tecnicamente bem construída, cedia espaço a visualizações subjetivas criadas a partir da impressão de objetos em papel fotográfico.
- E seus desfoques?
- São resultado de longas exposições, que provocam movimentos internos nas imagens. promovendo um rastro que ressalta a desconstrução da imagem fotográfica.
Movimento
A Teoria da Relatividade, de 1905, tendo em vista a ênfase de Einstein ao assegurar que o movimento na velocidade da luz deforma – literalmente - os corpos, gerou toda uma nova maneira de ver o mundo.
Do Manifesto Futurista, de 1910:
Tutto si muove, tutto corre, tutto volge rapido. Tudo se move, tudo corre, tudo muda depressa. Una figura non è mai stabile davanti a noi, ma appare e scompare incessantemente. Uma figura não é nunca estável diante de nós, mas aparece e desaparece incessantemente. Per la persistenza della immagine nella retina, pela persistência da imagem na retina, le cose in movimento si moltiplicanò, si deformano, as coisas se multiplicam, se deformam, o susseguendosi, come vibrazioni, nello spazio che percorrono. Sucedendo-se como vibrações no espaço que percorrem. Così un cavallo in corsa non ha quattro gambe. Assim, um cavalo correndo não tem quatro pernas: ne ha venti, e i loro movimenti sono triangolari. Tem vinte, e os seus movimentos são triangulares.
Giacomo Balla seguiu o Manifesto à risca:



MAS HÁ MAIS.
Quando João Lobo diz Entendo a fotografia como algo além do retrato, vejo que, com isso, volta a outro conceito revolucionário dos anos 1920. Aquele que Magritte pôs em prática no seu célebre Isto NÂO É um cachimbo, da série A Traição das Imagens:

Assim, quando João Lobo flagra seus jogadores de baralho, por exemplo, um dos quais nos mostra a cartada que tem na mão, não são Caravaggio e La Tour que tem em mente.


O que ele quer é o resultado de luz e da treva, principalmente da rica variedade de cinzas, mais o efeito do movimento flagrado Across lens. Como neste “papel de parede” do Windows, em que o assunto é o vidro, não a paisagem.

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