terça-feira, outubro 11, 2011

O País Onde Não Estou

Apesar dos muitos amigos comuns, nunca nos cruzamos. Eram tantas as histórias sobre o personagem que deploro não o haver conhecido. Escrevia para o Jornal do Commercio onde o lia religiosamente. Ontem, soube que o Duda Guennes havia subido. De conversa em conversa, nos baixa a certeza: a fila está andando. Todos os seus amigos a quem consultei, estavam absolutamente devastados. Um amigo, dizia o poetinha Vinicius, quando se vai, leva uma parte de nós. Abaixo, um dos seus textos que encontrei nos meus arquivos. HC

PÁTRIA, ESTE PAÍS ONDE NÃO ESTOU

Duda Guennes

Português é como gente, está em toda parte. Cerca de 4,7 milhões deles viviam “além-fronteira” no período 93/94, segundo dados oficiais da Direção-Geral dos Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas. Durante muito tempo, e parece que ainda continua, os portugueses eram (são) o principal produto de exportação de Portugal. Os emigrantes lusitanos dispersaram-se pelos “quatro cantos do mundo”, mas é no continente americano que a concentração é maior: 2.653,530, sendo 1,2 milhões encontram-se no Brasil e 523 mil no Canadá. Nos Estados Unidos vivem 500 mil, mas, dados mais recentes da DGCCP estimam em 1.153.351, os indivíduos de origem portuguesa, dos quais 210.122 nascidos em Portugal. Nos EUA, uma das maiores barreiras que os luso-americanos têm de transpor é a linguagem do país que os recebe. Aprendem-na e falam-na de ouvido. De “oitiva” aprenderão, mais tarde, os seus filhos, já fazendo as devidas adaptações lingüísticas que, às vezes, resultam numa mistela agridoce.

O escritor Onésimo Teotônio de Almeida andou pelos EUA e registrou no livro “Ah! Momim dum corrisco!...”, alguns letreiros em placas de lojas luso-americanas alguns exemplos desta nova realidade fonética.

Vejamos: Falasse Portuguese Nesta Estoa – o gajo quis dizer Store.
Nosso Bank tem Interesses Baixos – “Our bank offer low interests” – O nosso banco empresta a juros baixos.

Sale das Crimas – “christmas sale” – saldo de Natal.
Freijoeiras, Quase Livres “frigidaires almost free” – geladeiras quase grátis.
Agente Falemos Portuguêz.
Salve Dólas – “Save Dollars” – economize dólares.
Não Fumando no Oliveira – “No smoking in the elevator” – Não fumar no elevador.
Pai de Língua – “pie”, torta, empadão.
Vendesse casas sem nada para por em baixo – “Put down”, pagamento inicial.
Serviço que a gente é que se serve à gente mesmo “Self-service”.
Roupas Unisex, Para Gente de Um Sexo Só.
Beica Lusitána – “bakery”, padaria.
Pereira Funeral Home, o Anateca mais barato – “undertaker”, agente funerário.
Faça Arranjos com a gente. Cardoza’s Imports, queijo meio-mole, pão de minho, Merceles, Xourisso. Roupas para homens e outros artigos de senhora.
Sousa’s Fish Market, Cherimpe, Aquetapus, Bacalão, Sardines, Karapal, Peixhene Fresco e Frisado e Frito à Sexta-feira – “shrimp”, camarão; “octopus”, polvo; “freeze”, congelado.
Jeffrey Liquores Stone. Tem Port Wine da California.
Vende-se Taipes e Rádios que apanham Portugal.

IMIGRAÇÃO – A Casa do Brasil de Lisboa vai promover de 22 a 24 deste mês de outubro, um Simpósio sobre a Diáspora Brasileira: Emigração em Tempo de Globalização, o primeiro estudo sobre este recente fenômeno. Até 1986, com o falhaço do Plano Cruzado, o brasileiro não deixava o país, pelo contrário, o Brasil sempre foi “recebedor” de mão-de-obra estrangeira. Hoje, a emigração brasileira atinge, segundo estimativas do governo, mais de 1,5 milhão de cidadãos e é responsável pelo ingresso de divisas superior a 3 milhões de dólares anuais, contribuindo significativamente para o equilíbrio da balança de pagamentos do Brasil. É em cima dessa realidade que nós vamos conversar, pois, como dizia Fernando Pessoa, “Pátria, este lugar onde não estou”. O Simpósio é organizado pela Casa do Brasil e pelo Consulado brasileiro e conta com a participação do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, do Centro de Estudos de Migrações da Unicamp e do Conselho Nacional de População e Desenvolvimento.

Jornal do Commercio – 30/09/1997

Um comentário:

Aline Alexandrino disse...

A matéria ficou ótima. Fez jus ao Duda. Considere-se osculado também. Especialmente pela matéria sobre o nióbio. Ô paizinho sem informação, esse nosso...
Aline