quarta-feira, agosto 03, 2011

O CINEMA EM ótima SAFRA






W. J. Solha



Ao contrário do que acontecia ultimamente, em que eu deixava muitos filmes a que assistia pela metade, ou – no caso de DVDs – estirava o controle remoto para a TV, acelerando histórias que se arrastavam, tenho visto bons trabalhos.

Confesso que as obras de Woody Allen já não me atraíam desde que comecei a confundi-las umas com as outras, pois ali estava sempre o mesmo jeremias novaiorquino e suas intermináveis penúrias. Claro: “Mannhatan”, “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa”, “A Rosa Púrpura do Cairo” , “Hannah e suas Irmãs”, “A Rosa Púrpura do Cairo” e “Zelig” são inesquecíveis, mas isso em uma filmografia de cinqüenta títulos.

Ao ver tantas referências positivas ao “Meia-Noite em Paris”, no entanto, resolvi arriscar. E me vi, ao final da sessão, fazendo um inusitado lamento de quero-mais: “Ah!...” Mesmo considerando que o roteiro mexe com coisas que me fascinam – literatura americana e pintura europeia da primeira metade do século XX – confirmo a opinião de todos os críticos que li antes de ir ao cinema: trata-se de mais um belo trabalho de Woody. A sequência inicial, em que apresenta Paris ao som de típica cançoneta francesa, já se tornou tão justificadamente famosa quanto a de “Mannhatan”, em que mostra uma Nova Iorque em preto e branco, ao som da Rhapsody in Blue de Gershwin. Nem se pode dizer que a ausência dele como ator contribuiu para que tudo me agradasse mais: ver Owen Wilson, que faz o personagem principal – Gil - atrapalhado, hesitante, deprimido, extasiado, foi o mesmo que ver o autor do script e diretor em cena.

Deliciosas as transições fáceis que Woody faz entre o presente e os anos vinte do século passado e também para a Belle Époque. Apesar de saber que veria isso, eu me senti tão prazerosamente surpreso quanto Gil ao me deparar com o casal Scott Fitzgerald e Zelda depois das beladormecidas badaladas da meia-noite, dupla esfuziante que o leva a Hemingway, Gertrud Stein, a um Picasso ainda começando a perder os cabelos e o castelhano, depois a Dali, Buñuel, etc, etc.

Trailer: http://www.youtube.com/watch?v=aYP4RfN1NvU


Barry Levinson não pertence ao primeiro time dos diretores da atualidade, mas fez um bom “Rain Man” anos atrás, e, agora, este show de interpretação de Al Pacino (reconhecível apenas pela vez rouca) fazendo o papel de Jack Kevorkian - conhecido como Doutor Morte, por propiciar suicídio assistido ( eutanásia ) a doentes terminais, no calvário de suas insuportavelmente prolongadas agonias. Pareceu-me em extremo comovente a sequência do tribunal, em que o advogado de defesa do médico apresenta ao júri vídeos com depoimentos das “vítimas” de seu cliente, colhidos pelo próprio Kevorkian ao entrevistá-los a fim de ver confirmada, neles, a decisão de morrer.

Trailer: http://www.youtube.com/watch?v=_368ZnySjvE


Esse filme de Gavin Hood - ganhador do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro de 2006 – foi rodado numa periferia de Johannesburg, África do Sul, que lembra muito a Cidade de Deus de Fernando Meirelles e a favela de Mumbai, na Índia de “Quem quer ser um Milionário?” (de Danny Boyle) , e tem no ator principal Presley Chweneyagae, que faz Tsotsi, alguém que faria tranquilamente o papel de Nelson Mandela na adolescência, se quisesse: o mesmo olhar arguto, o mesmo rosto de maçãs largas. Miséria, infância com mãe doente, pai alcoólatra e violento, enorme carência afetiva, fazem com que o jovem bandido se transforme ao dar com um bebê no assento traseiro do carro que rouba, depois de dar um tiro na dona. Dá à criança o próprio nome ( David. Tsotsi é apelido), e se realiza oferecendo-lhe o excessivo carinho que jamais recebera. Belamente fotografado, um rap contagiante como trilha sonora, bom elenco, “Infância Roubada” merece ser visto.

Trailer: http://www.youtube.com/watch?v=dpO-sahNzfg


Esse filme me fez entender melhor a razão pela qual Evo Morales governa a Bolívia. “A Mesma Chuva” ( “Even the Rain”, “También la Lluvia”) é uma densa criação da diretora espanhola Icíar Bollaín e por isso me agradou muito, apesar de ter Gael García Bernal – o inconvincente Chê Guevara de “Diário de Motocicleta” – no elenco, falha que é fartamente compensada por um excelente Luis Tosar (que olha para o vidrinho com água, aí no cartaz). Belamente construída, a história junta o presente miserável dos índios latino-americanos com a de seus ascendentes do século XVI. Sebastian (Bernal) roda um filme sobre Colombo – na verdade sobre a impiedosa ganância espanhola - num país escolhido justamente pelo baixo custo da mão-de-obra. Ele precisa de enorme figuração e a produção é tremendamente limitada. Acontece que os “bugres” (como ele os chama) estão em luta contra o governo que pretende entregar a distribuição de água do país a empresas estrangeiras. Cochabamba por isso ferve, nas cenas finais, tanto quanto a Mogadíscio do “Falcão Negro em Perigo”, de Ridley Scott, no combate contra os soldados americanos.

Trailer: http://www.youtube.com/watch?v=hbpdeI0ugGc



“Lope” – produção Brasil/Espanha, direção do brasileiro Andrucha Waddington – deveria ser visto numa mesma sessão com o “Shakespeare Apaixonado”, de Johnn Maden. Uma realização do primeiro, outra do terceiro mundo, ambas abordando o mesmo século XVI e suas nações mais poderosas – Inglaterra e Espanha –, com os poetas-e-dramaturgos Shakespeare e Lope de Veja sintomaticamente mostrados num “Shakespeare Apaixonado” climb – limpo, bonito, rico, e num ”Lope” trash: pobre e sujo. Para infelicidade de Waddington e dos produtores, a obra de Lope não tem, nem de perto, o alcance da de Bill, restando – como foco – a sedução dos dois personagens. Apesar disso e por isso mesmo, “Lope” me agradou bastante.

Trailer: http://www.youtube.com/watch?v=k2jIj_zfwvQ

Um comentário:

Márcia Barcellos da Cunha disse...

Assistir um bom filme é seguramente uma opção perfeita, um hábito salutar.É mágico!
Grata. Márcia Juiz de Fora MG