sábado, maio 21, 2011

Velho Testamento: a curiosa história de Balaão

José Virgolino de Alencar

Do Velho Testamento, no livro dos Números, capítulo 22, destaco os versículos 21-35, que conta parte da curiosa história de Balaão e sua jumenta:


“Balaão levantou-se de manhã, selou sua jumenta, e partiu com os chefes de Moab. O Senhor irritou-se com sua partida, e o anjo do Senhor pôs-se-lhe no caminho como obstáculo. Balaão cavalgava em sua jumenta acompanhado de seus dois servos. A jumenta, vendo o anjo do Senhor postado no caminho com uma espada desembainhada na mão, desviou-se e seguiu pelo campo; o advinho a fustigava para fazê-la voltar ao caminho. Então o anjo do Senhor pôs num caminho estreito que passava por entre as vinhas, com um muro de cada lado. Vendo-o, a jumenta coseu-se com o muro, ferindo contra ele o pé de Balaão, que a fustigou de novo. O anjo do Senhor deteve-se de novo mais adiante em uma passagem estreita onde não havia espaço para se desviar nem para a direita nem para esquerda. A jumenta, ao vê-lo, deitou-se debaixo de Balaão, o qual, encolerizado, a fustigava mais fortemente com o seu bastão. Então o Senhor abriu a boca da jumenta, que disse a Balaão: “Que te fiz eu? Por que me bateste já três vezes?”. “Porque zombaste de mim”, respondeu ele. “Ah, se eu tivesse uma espada na mão! Ter-te-ia já matado!”. A jumenta replicou: “Acaso não sou eu a tua jumenta, a qual montaste até o dia de hoje? Tenho porventura o costume de proceder assim contigo?”. “Não”, respondeu ele. Então o Senhor abriu os olhos de Balaão, e ele viu o anjo do Senhor que estava no caminho com a espada desembainhada na mão. Inclinou-se e prostrou-se com a face por terra. “Por que, disse-lhe o anjo do Senhor, feriste três vezes a tua jumenta? Eu vim opor-me a ti porque segues um caminho que te leva ao precipício. Vendo-me, a tua jumenta desviou-se por três vezes diante de mim. Se ela não o tivesse feito, ter-te-ia matado, e ela ficava viva.” Balaão disse ao anjo do Senhor: “Pequei. Eu não sabia que estavas postado no caminho para deter-me. Se minha viagem te desagrada, voltarei”. “Segue esses homens, respondeu-lhe o anjo do Senhor, mas cuida de só proferir as palavras que eu disser”. E Balaão partiu com os chefes de Balac.”

Os teólogos nos ensinam que a história da jumenta de Balaão é uma metáfora bíblica, significando que a escolha de nossos caminhos seja feita seguindo a vontade de Deus. Como metáfora, como simbologia ou como um convencimento para a fé, está tudo bem. Católico que sou, não quero questionar os ensinamentos de nosso Pai, o Criador.

Contudo, heresias à parte, imagino uma situação real/virtual para a história. Se o cinema, na sua virtualidade e no desejo de apresentar filmes como coisa real, entender de rodar uma película seguindo, no enredo, todo o desenho do caso da jumenta de Balaão, é possível que, na visão de espectadores, fiquemos com muitas e metafísicas dúvidas.

Imaginem o personagem Balaão em sua jumenta e esta vendo um “anjo”(um ator, claro, representando) com uma espada desembainhada, falando para ela, enquanto Balaão não podia vê-lo. E por não ver o anjo, Balaão fustigava a jumenta e a maltratava. A jumenta, por graças do anjo do Senhor, começa a falar e protestar pelas fustigadas impostas por Balaão. E Balaão explica à jumenta que assim procedeu porque se sentiu zombado em face da desobediência às suas ordens.

De repente, após o diálogo com o animal e reagindo ao aceno do anjo, Balaão passa a ver a entidade angelical em forma de pessoa com a espada na mão, prostra-se diante dela e se justifica pelos maus tratos à jumenta. O anjo esclarece a Balaão que veio opor-se a ele, por seguir um caminho que o levaria ao precipício, acrescentando que, se a jumenta não tivesse se desviado, ele, o anjo, o teria matado e preservado o animal vivo.

Balaão confessa, então, que pecou porque não sabia(até parece personagem da nossa realidade atual) que o anjo estava ali para detê-lo, completando em sua vênia ao Senhor que, se a viagem era do desagrado do Mestre, ele desistiria e voltaria à sua casa.

Ao que, como final da fita, conclui o anjo em nome do Senhor: “Segue a viagem, mas cuida de só abrir a boca para proferir palavras que eu disser”(mais uma circunstância a coincidir com a realidade atual, onde calha a necessidade de se mandar um ilustre personagem calar o bico e só falar, no teleprompter, o que um puxa-saco mais sensato escrever).

Cotejando o presumível filme sobre a jumenta de Balaão com a própria história contada na Bíblia, vem-me à luz o fato de se considerar as imagens cinematográficas como nada além de um filme, tendo também, e por analogia, a história bíblica na conta de uma alegoria que só a fé, e muita fé, aceitará e crerá em sua veracidade.

Convenhamos que cinema e evangelho andam juntos no imaginário das pessoas, havendo um pêndulo entre realidade e virtualidade, embora (eu pecador e leigo) não desconheça a complexidade e profundidade da palavra do Senhor e o respeito que devemos ter por ela.

Porém, nessa história do jumenta, como também na do “bode expiatório”(outra estranha passagem do Velho Testamento), há muito de lendas das mil e uma noites.

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