terça-feira, maio 31, 2011

HILDEBERTO BARBOSA E O SINAL DE CAIM


W. J. Solha

Em À Sombra do Soneto e Outros Poemas, Hildeberto Barbosa Filho – que além de poeta é crítico literário de nome – opina nos primeiros versos de seu curto Insight:

- Tenho para mim / que nunca escrevi um poema.

Natural, para quem confessa, doloroso:

- Nem as coisas perfeitas me fazem feliz.

E o que são coisas perfeitas, no entender dele?

- ... telhados molhados, estações de trem (depois das despedidas, ) casas em ruínas.

Também acho Poesia difícil. Terrível criá-la, insuportável analisar a criação alheia. Raramente somos levados - ao produzir esse gênero literário que, segundo Umberto Eco, se define pelo fato de raramente chegar ao fim das linhas - à saciedade que, àvidamente, buscamos na fatura de toda e qualquer obra de arte. Talvez justamente porque seja de resultado tão escasso, o que implica sempre de se ter de liquidá-la num tiro só. E se já é quase impossível satisfazer-se o poeta com o que faz, mais inacessível ainda é a plenitude com o que fazem os outros.

Li o pequeno livro novo de Hildeberto sentindo-o poeta e crítico em dueto e duelo consigo mesmo. Fica óbvio que ele sente as pepitas quando as tem na bateia, como ao ver num velho umbuzeiro o talhe bruto, /solitário verdume na paisagem.

A infância é sua Pasárgada. É lá que encontra sua cidade, solitária, sedenta entre montanhas.

É de lá que sente brisas com cheiro de alfazema. Daí – conclui – que é preciso guardar bem nos celeiros d´alma a messe dos encantos primeiros/ Que a leva do tempo distancia./ Guardar nos oratórios o palor de antigos santos e tudo o que for miúdo relicário de Poesia.

Mas saber disso não o torna menos angustiado. É evidente que Hildeberto tem o sinal de Caim, de que fala Hermann Hesse no “Demian”(*). O Poeta escreve:

- É a ira de viver que me põe vivo.

Motivo?

- Todos os anos passaram por mim e o futuro não chegou.

Como assim?

Replay:

- Tenho para mim / que nunca escrevi um poema.

Mas ele escreveu, sim. E aqui vai:

Recorrência

Sempre amei as pedras.

Brutas,
raras,
cálidas
sempre amei as pedras.

Túmidas,
toscas,
tristes,
trágicas
sempre amei as pedras.

Súplices,
Sacras
sempre amei as pedras.

Perfeito!


(*)A marca de Caim aí aparece como sinal dos seres superiores, onde algo de diabólico coexiste com um traço de humanitarismo e criatividade.

Um comentário:

Ana Arnaud disse...

E tome banho de cachoeira...rsrsrs...