domingo, abril 04, 2010

THE LION


Aline Alexandrino

“tudo seria fácil se não fossem as dificuldades”*

Escrevo sob o impacto anual da declaração do Imposto de Renda. Digo impacto porque, no meu caso, assalariada e atualmente aposentada como professora de universidade pública, dificilmente se poderá falar sobre renda. Porém, como não me considero dona da verdade, resolvi escarafunchar as definições lingüísticas e fui ao pai dos burros para tentar entender que diabo era renda e o que era salário.
Após consulta (Michaelis) descobri que renda, no sentido do Leão, entre outras coisas pode ser:

ren.da1
sf (der regressiva de render) 1 Produto anual ou mensal de propriedades rurais ou urbanas, de bens móveis ou imóveis, de benefícios, capitais em giro, empregos, inscrições, pensões etc.; produto, receita, rendimento. 2 Rendimento líquido depois de deduzidas as despesas materiais. 3 Rendimento coletável dos cidadãos, que serve de base para o exercício de certos direitos políticos. 4 Importância superior a determinado limite e estabelecida pelas leis fiscais como rendimento da atividade econômica do indivíduo.

Imposto sobre a renda: tributação sobre pessoas físicas, ou empresas, baseada na renda líquida auferida no ano anterior.

Por sua vez, salário significa:
Sal.ário
sm (lat salarium) 1 Estipêndio ou remuneração por um serviço prestado, principalmente por dia e por hora; jornal, soldada, soldo. 2 Castigo, recompensa.

Pela leitura das definições pode deduzir-se que renda e salário não tem nada a ver uma com o outro, uma vez que renda tem a ver com capital e salário com remuneração por serviço prestado. Como o dinheiro com que pago as contas vem apenas do salário, já que não possuo bens que me forneçam renda, concluo que não deveria pagar qualquer imposto (se bem que salário também pode significar castigo, o que no meu caso se aplica como uma luva). Mas, por amor à precisão dos fatos, fui atrás da etimologia das duas palavras (da Cunha) e eis o que descobri:

Renda
Sf. Resultado financeiro de aplicação de capitais ou economias, ou de locação ou arrendamento de bens patrimoniais. Talvez do provençal renda (do latim rendita), ou aquele que arrenda propriedades rústicas.

Salário
Do latim salarium/ii, derivado de sal/salis, ou seja, sal, substância que era usada como pagamento de serviço em Roma.

Em qualquer dos casos, lingüística ou etimologicamente, as duas coisas não se confundem, o que me leva a argumentar que pago imposto não sobre a renda, e sim sobre o salário (amargo como o sal). No meu caso, inclusive, ainda pago uma “contribuição para seguridade social dos aposentados”, ou seja, continuo pagando a minha aposentadoria, depois de aposentada !!! Cuma?! Pois é, caros blogueiros, paguei mais de 30 anos ao INSS para me aposentar e continuo pagando depois de me aposentar. Dá pra acreditar? Dááááá... Neste país, tropical e bonito por natureza, cujo conterrâneo mais ilustre é Deus, tudo é possível e, na maioria dos casos, o dia seguinte sempre consegue ser pior que o dia anterior.

De qualquer modo, a minha busca não foi em vão. Consegui entender afinal porque, mesmo não tendo renda, tenho que pagar imposto de renda. Se voltarem às definições da mesma, notarão que a terceira diz que é o “rendimento coletável dos cidadãos, que serve de base para o exercício de certos direitos políticos”. A quarta definição decreta que também é a “ importância superior a determinado limite e estabelecida pelas leis fiscais como rendimento da atividade econômica do indivíduo”. Finalmente decifrei a charada. A “coisa” se baseia em duas premissas: o objetivo da coleta (= o exercício de certos direitos políticos) e o arbítrio arbitrário (= determinado limite estabelecido pelas leis fiscais). Em ambos os casos, os critérios foram estabelecidos por alguns indivíduos que tem como endereço um certo planalto central e suas ramificações estaduais e municipais. Os nossos direitos políticos e o limite estabelecido pelas leis fiscais não foram debatidos e defendidos como deveriam ser, uma vez que nossos representantes (?!), na maioria dos casos, adotam critérios próprios, de acordo com o interesse (deles) do momento. Afinal, quem tinha razão era o meu guru, o Barão de Itararé, quando dizia que “os vivos são cada vez mais governados pelos mais vivos” ou, “tem políticos cuja vida pública é a continuação da privada'' (e outubro está chegando...)

*Barão de Itararé

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