domingo, dezembro 13, 2009

Ladrões de óculos

MARCUS ARANHA

É costume milenar imortalizar personalidades moldando-lhes a imagem em estátuas em pedra, mármore ou em bronze, colocando-as em praça pública, para lembrança e admiração do povo. Nossa cidade não é tão rica em estátuas.

Há falta delas e muitas das poucas que temos têm sofrido a ação de vândalos.

Esta é a terceira vez que trago o assunto a público, pois cada vez que vou dar um giro para ver como andam nossas estátuas, encontro a coisa do mesmo jeito ou pior.

O barão de Rio Branco, estadista, diplomata e historiador emérito, tinha na praça que leva seu nome, uma herma de bronze. Ela desapareceu e foi substituída por uma cópia pirata em pedra calcária, da qual, há anos, arrancaram uma mão. Hoje, Rio Branco continua lá com um braço cotó, abandonado e exposto a outras amputações.

Anthenor Navarro, companheiro de José Américo e extremamente míope como ele, teve sua estátua colocada na praça dele, representada com os seus inseparáveis óculos. Pois bem, roubaram os óculos de Anthenor! Deixaram-lhe somente as pernas do instrumento.

O maior monumento que temos na cidade está na Praça João Pessoa, com quatro faces correspondendo aos quatro pontos cardeais. Além da estátua do homenageado em corpo inteiro há outras três belíssimas representações em bronze, estátuas magníficas de mais de 2 metros de altura. Pois nem a essas os vândalos respeitaram: roubaram as espadas dos dois gladiadores que se encontram na face sul. Estão lá eles somente como os punhos das espadas nas mãos e os escudos nos braços. As lâminas de suas espadas desapareceram...

Padre Hildon Bandeira foi um sacerdote que teve uma atuação marcante na paróquia de Santa Júlia. Fez um trabalho social importante nas imediações dela, atingindo os pobres moradores das imediações da Av. Beira Rio. Nessa avenida, na entrada da comunidade que leva o nome dele, puseram-lhe uma estátua modesta de concreto, retratando-o como ele sempre se apresentou, de óculos. Pois não é que roubaram os óculos de Padre Hildon! E levaram completamente, não deixando nem as pernas.

Há uma estória que não sei se é verídica. Contam que na transferência da herma de Epitácio Pessoa, da Praça João Pessoa para a avenida que liga a cidade a praia, quebraram um braço de Epitácio, logo o que aponta. E depois descobriram que o braço havia desaparecido do depósito da Prefeitura. A coisa foi tão grave que só provocou murmúrios: roubaram o braço de Epitácio! Liberais remanescentes logo puseram a culpa em descendentes de perrepistas. E estabelecido o mistério, a coisa rolou algum tempo. Depois o braço apareceu deixado no depósito por mãos misteriosas.

A Prefeitura colocou na cidade estátuas de Livardo Alves, Augusto dos Anjos e Mané Caixa d’Água. Da do poeta Manoel José de Lima, popular Mané Caixa d’Água, ao lado da Praça Aristides Lobo, os vândalos arrancaram um pedaço do nariz, e depois, um braço. Levaram a estátua para reparos e ainda não voltou ao lugar. Livardo está no Ponto de Cem Réis: mas, já lhe levaram os óculos. Augusto está intacto porque fica mesmo em frente ao quartel da polícia.

E os sem estátua?

José Américo de Almeida! O maior absurdo que se conhece: não há um só logradouro público que tenha uma estátua de Zé Américo. E Walfredo Guedes Pereira? O maior prefeito da cidade, que doou o terreno da Praça da Independência, não tem uma estátua dele lá. E Tiradentes, cuja praça virou São Gonçalo. Castro Pinto, Caldas Brandão, Simeão Leal e General Lavanère Wanderley, apesar de terem praças com seus nomes, não têm estátuas nelas.

Nossa cidade não é a única onde os depredadores de estátuas agem.

No calçadão de Copacabana há uma estátua do poeta Carlos Drummond de Andrade, sentado de costas para o mar, de óculos, com feições introspectivas. Hoje Drummond está sem os óculos, que já foram arrancados do seu rosto sete vezes!

A Prefeitura do Rio desistiu de repor os óculos de Drummond condenando-o a ver tudo embaçado. Mas uma firma fabricante de lentes resolveu se responsabilizar pela escultura, instalando câmeras de vigilância para depois, presentear o príncipe da poesia brasileira com a sua oitava armação de óculos.

Publicado em o CORREIO DA PARAÍBA de 13 de dezembro de 2009

Um comentário:

Hugão disse...

Aqui em Recife, há uma estátua de Simon Bolivar na Av. Cruz Cabugá perto da Escola de Aprendizes Marinheiros onde o heroi está sem a espada. Pela enésima vez. Esse Caldas Brandão da praça (?) em frente ao Hospital Santa Isabel é o meu avô paterno.
Hugo