terça-feira, outubro 28, 2008

Um paraibano bem paraibano


Elpídio Navarro

Lendo Luiz Augusto Crispim, fico sabendo que Roberto Rabelo (Bob Rabel) já é falecido a coisa de um ano. Há muito tempo não ouvia sequer falar sobre ele. O conheci aqui em João Pessoa bem antes dele ter emigrado para o Rio de Janeiro buscando um lugar ao sol na música, como cantor.

A última vez que nos encontramos foi num dos anos sessenta, quando dirigindo o "Auto de Maria Mestra" , fui ao Rio apresentar a peça de Altimar Pimentel, no Teatro Nacional de Comédia. Lá, recebemos a inesperada visita de Roberto Rabelo, que após o espetáculo, exigiu a nossa presença no show que apresentava numa boate, pros lados de Copacabana. Adotara o nome artístico de Bob Rábel e encontrava-se no Rio tentando a sua carreira de cantor e já era crooner de um conjunto que tocava na boate Hecatombe, na Galeria Alasca, em Copacabana. Foi assistir ao nosso espetáculo, principalmente para rever o pessoal da terrinha.

Fomos recebidos com aplausos e elogios dele, ao microfone da casa. Uma grande mesa estava reservada para nós e lá fomos acomodados. Cervejas, petiscos e dança, e assim estávamos a participar da noite carioca. Ele dividia o tempo entre a nossa mesa e o palco e a cada momento fazia um elogio a alguém do grupo ou a alguma coisa importante relacionada com a Paraíba. No início até que ficamos lisonjeados e felizes, sem quaisquer constrangimentos, bem à vontade, mesmo porque éramos praticamente os únicos fregueses da boate, pois havíamos chegado bastante cedo. No entanto, uma meia hora depois a Hecatombe começa a receber o seu público habitual e foi ficando cheia, com quase todas as mesas sendo ocupadas. Não bastasse o fato de estarmos numa posição de destaque no salão, o que já poderia provocar algum tipo de reação dos freqüentadores, Roberto não parava de falar sobre nós durante os breves intervalos entre uma música e outra que cantava, o que já começava a causar algum vexame. O pior era que não tínhamos a menor condição de pedir para que ele parasse, pois seria, no mínimo, uma indelicadeza da nossa parte. Fomos salvos, momentaneamente, pelo intervalo feito pelo conjunto musical, quando ele veio á mesa pedir a nossa opinião sobre o que estava fazendo, recebendo, naturalmente, agradecimentos e elogios de todos, pois ninguém tinha a coragem de dizer que ele não estava agradando aos outros freqüentadores...

Foi então que alguém teve a idéia de pedir que, quando reiniciasse a apresentação, ele cantasse uns tangos, pois gostávamos muito. Na verdade, o que se queria era não dar oportunidade para ele fazer citações sobre a Paraíba, pois com samba dava Paraíba, com baião também, com marcha e frevo aí era que dava mesmo, e até com bolero ele fez referência as noitadas dos clubes sociais de João Pessoa, conseqüentemente, Paraíba! Agora, com tango julgamos ser impossível. Apenas ele poderia dizer que estava atendendo algum pedido nosso, o que não era nada, comparando com o que estava acontecendo. O nosso Roberto Rabelo sobe ao palco, pega o microfone e lasca um discurso:

- Para começar, vamos atender a um pedido do pessoal da Paraíba cantando tangos. Como vocês sabem, o nosso querido Estado faz fronteira com a Argentina, por isso, há uma grande influência da música portenha em toda a região. Maestro! “Corrientes, três, quatro, oito...”

Por fim, a orquestra ataca de samba canção e arrisco-me ir até ao salão para dançar. Durante a dança ouço uma jovem dizendo para o seu parceiro:

- Esse pessoal da Paraíba é metido a coisa... Eu já fui lá, não tem nada demais! Só dois clubes, um chamado Astrea e outro chamado Cabo Branco... Querem ser importantes só porque moram perto da Argentina...

Tenho certeza de que ela falava alto, propositadamente, para que eu ouvisse!(20-10-2008)

Elpídio Navarro é professor universitário, dramaturgo e diretor teatral, além de editor do www.eltheatro.com

Um comentário:

Roberta Rabelo disse...

Oi,
Ri muito com tudo isso...
Sou filha de Roberto Rabelo e é um prazer enorme saber que você era amigo do meu pai...
A estória é muito boa!
Um grande abraço!