sexta-feira, agosto 31, 2007
RECUERDO 23 - O CAPUCHINHO NAZISTA
HUGO CALDAS
Não me tomem por iconoclasta. Não é o caso. Coisas que ficaram por uma vida inteira "varrumando o meu miolo", realmente aconteceram. Precisam e devem ser contadas. Daí a razão pela qual as relato. Não sou evangélico, muito menos católico, considero-me cristão por um mero acidente histórico-geográfico. Nascí em uma terra descoberta e colonizada por cristãos. Acho até que sou uma boa pessoa, um bom "cristão". Como poderia ter nascido no Oriente e hoje seria apenas e tão somente um bom Mulçumano.
O "Capuchinho Nazista" em epígrafe não é outro senão o tão propagado Frei Damião de Bozzano. Nascido Pio Giannotti, em Bozzano Itália, em 5 de novembro de 1898, radicado no Brasil desde o final da década de 30 até a sua morte em 1997. Camponês, filho de camponeses interrompeu seus estudos eclesiásticos para ir à guerra de 1914/1918. Combateu pelo exército italiano. Será que matou alguém? É bem provável. Ninguém vai à guerra levando flores para o inimigo.
Ao final das hostilidades volta ao seminário e torna-se padre em 1923. Diplomado em Teologia (sic) vem para o Brasil em 1938 e aí se inicía toda uma imensa loucura. Frei Damião de Bozzano era, nada mais natural, inimigo declarado do comunismo, era contra a minissaia, contra o sexo antes do casamento porém, o mais grave, era fanáticamente, useiro e vezeiro em perseguir evangélicos e tudo o que eles representavam.
Conta-se que Frei Damião, junto com outras autoridades católicas, mandava cercar, incendiar, cortar a energia, e apedrejar templos protestantes os quais após tamanha agressão, e sofrimento ainda conseguiam se reerguer das cinzas. Essas agressões e cercos às vezes duravam horas. Muitos desses agressores gritavam insultos aos crentes, que na época eram chamados de “bodes” pelos católicos. A maioria usava túnicas marrom-escuro, típicas dos capuchinhos e gritavam palavras de ordem exaltando Frei Damião.
Aliás, muito antes dele, essas perseguições já aconteciam em pleno Século Dezenove. A escritora Leonice Ferreira da Silva em seu livro "Primeira Igreja Batista do Recife, Episódios De Sua História" relata:
..."No interior, vigarios e autoridades tomavam-lhes as bíblias que eram queimadas nas feiras livres. Em 1892, em Pernambuco, estão no auge as perseguições na Capital e no Interior do Estado. No Recife, levantou-se o Frei Celestino de Pedavoli, criando a Liga Anti-Protestante, que realizou queima de bíblias, uma no pátio da Igreja da Penha e a outra, por causa dos protestos e das reações, inclusive dos não crentes, na horta do convento..."
A minha participação nessa historiada toda:
No início da década de sessenta, eu trabalhava em um escritório do exército norte-americano e involuntariamente tomei parte em uma dessas histórias malucas tendo o "piedoso" frade como protagonista. Por qual razão um Doutor em Teologia se transforma no mais fanático adepto das práticas nazistas, é dificil acreditar.
Se não me falha a memória, o caso a seguir quase teve implicações diplomáticas, e se deu em Pesqueira, interior do Estado, quando ele, Frei Damião de Bozzano chegou ao paroxismo de excomungar os leiteiros da cidade que tivessem a audácia de vender leite para as famílias protestantes. Perceberam a gravidade e a crueza do ato? Sem leite, com o tempo, as crianças iriam definhar e naturalmente a morte sobreviria. O imbróglio envolveu o Consulado Geral dos Estados Unidos e o Arcebispado. Vale ressaltar que todas ou quase todas as igrejas protestantes eram apoiadas pelo Consulado Americano visto a presença de pastores norte-americanos na implantação dos templos. Não obstante as inúmeras reuniões e encontros entre as partes Cônsul - Arcebispo, "segure esse maluco", chegou a declarar o Cônsul para o Arcebispo que teve de engolir calado por conta das barbáries cometidas pelo "santo homem". Ficou acertado, em vista da grave situação, que o governo americano iria daquela data em diante, enviar sacos de leite em pó, distribuidos pela Aliança para o Progresso - àqueles mesmos que os gringos sacodem dos aviões para os esfomeados que conseguem escapar dos seus bombardeios. Eu mesmo despachei dois caminhões enormes com o tal leite para o interior. O problema foi sendo esquecido e terminou sem maiores consequências como tudo neste país, e ficou o dito pelo não dito.
Ao final da sua vida de "romarias e pregações" vivia Frei Damião conluiado com os políticos matreiros que se aproveitavam e tiravam fotos ao lado dele, a fim de mais tarde serem usadas para estampar santinhos de campanhas eleitorais. Collor e Nilo Coelho recebiam o seu apoio e costumavam usar o odioso expediente das fotos.
O processo de beatificação que já está bastante adiantado, é o primeiro passo para receber a canonização ou seja, o frade vai terminar recebendo o brevet de santo. Este ano se comemoram os dez anos da sua morte. Precisam ver a caravana de ônibus com placas de todo nordeste atrapalhando o trânsito aqui no bairro do Pina onde existe o Mosteiro de São Félix de Cantalice e onde o frade está enterrado.
Este fim de semana a cidade de São Joaquim do Monte, no agreste pernambucano, está promovendo mais uma romaria dos devotos do frade. Com missas, terços, ladainhas, (está virando atração turística) e uma estátua enorme, mal ajambrada, pobre arremedo, débil paródia de outra estátua maior ainda, de outro malucoide, o Padre Cícero Romão Batista, o Padim Ciço do Juazeiro, que boa coisa também não era.
Espero, se realmente existir alguém lá em cima, que este alguém tenha piedade desses dois desarrazoados.
hugocaldas.blogspot.com
hucaldas@gmail.com
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5 comentários:
Amigo Hugo:
Um belo artigo sobre o velho Torquemada do cariri. E o amigo está escrevendo cada vez melhor.
Abraços,
Almir
Hugo, gostei da historia do Frei Damião, que nunca fui com sua cara e nem com suas pregasões.
Aquele abraço, Amilcar
Hugo,
Não tinha idéia das armações do Frei Damião. Com o crédito e fidelidade de tantas peesoas inocentes os seus seguidores, e agora como ficam???
Agora na condição em que está a prestação de contas só com Deus.
Muito bom o texto. Parabéns.
Mary
Hugão, esse "pescoço de bengala" era um grande mau caráter, sempre aliado aos poderosos, e disposto a descer o cacete em quem não concordasse com suas idéias fascistas. Mas o povão é cego e surdo, ele vai ser canonizado e virar mais um mito na longa história de alienação e ignorância de nossa gente. Por que a Igreja Católica, que se mete na vida de todo mundo, não vem a público dar sua opinião?
Carlos
Hugão, esse "pescoço de bengala" era um grande mau caráter, sempre aliado aos poderosos, e disposto a descer o cacete em quem não concordasse com suas idéias fascistas. Mas o povão é cego e surdo, ele vai ser canonizado e virar mais um mito na longa história de alienação e ignorância de nossa gente. Por que a Igreja Católica, que se mete na vida de todo mundo, não vem a público dar sua opinião?
Carlos
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